segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Flor de Açafrão (Aniversário)


     

     Muita gente tem essa mania de comparar seu amor ao sol, aos raios de sol, ou qualquer coisa que lembre o calor. Não é meu caso. Meu amor é diferente. (Ainda chamo “meu amor” porque Eros é simplesmente muito chato para ir embora ao meu comando. Mas não passa disso: um amor inconveniente, insistente.) Sempre o comparei ao inverno. E até chamava-o assim, por um motivo acolá. É algo que nós sabemos, algo tão nosso que não faz sentido para mais ninguém; todos torciam o rosto quando tentávamos explicar. Dividíamos sempre esse amor declarado pelo tempo frio; então, era coerente. Ele era meu inverno particular. 

     E eu era outro personagem que, enfim, não citarei aqui. Já não faz tanto sentido assim. O que me faz mais sentido agora é me chamar de açafrão, que possui a flor de inverno mais complicada que pude achar para embelezar um texto feio. Ela tão cheia de não-me-toques! Não é qualquer um que quer processar manualmente 10 mil flores para ter apenas um quilo de açafrão (especiaria) no final, não é? Essa sou eu. Dou um trabalho danado. Costumo compensar, mas, ao que parece, saio bem cara no final das contas. 

     Mas sim. Sou bonita, em algum aspecto. E forte. É o que dizem: flores de inverno são mais fortes do que flores de verão. Não sou girassol, rosa vermelha, orquídea, nada assim. Gosto do frio. E diria que suporto toda a estação. O que não costumo gostar muito é da primavera, pasmem. Verão me deixa com náuseas. E quando começa a esfriar lá fora, então... Céus! Maldito outono que nunca passa! Podem levar para longe todas as outras estações, porque sou chata: só floresço quando Inverno chega. E agora nem sei em que estação estamos – quero dizer, estou. Sei que não florescerei tão cedo, que vou demorar a me acostumar com esse calendário estranho sem Inverno, sem frio. Só um calor desconhecido e desconfortável. 

     Saudades à parte, me considero uma flor de inverno “velha de guerra”. Já aguentei tanto dessa estação, que diria que já posso me aposentar. É hora de não desabrochar mais, sabe? Inverno vem, Inverno vai. Inverno não sente falta de flores; Inverno às vezes é frio demais. Talvez eu largue mão de ser flor de açafrão para ser flor de verão, um dia. Quem sabe outra estação que não maltrate tanto. Porque já não compensa ser flor de quem me esmaga, indiferente. Esse açafrão não suportaria mais um inverno interno daquele meu Inverno.
(Deyse Cruz)

Um comentário:

Lança uma flor ou uma flecha. Só não passes por aqui sem deixar-me um pouco de ti.

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