Parou e olhou para os lados com um medo nervoso de encontrar alguém que a observasse. Olhou para trás com pesar, compenetrou-se em todas aquelas árvores, portais para os sonhos de fada e sonhos pueris e doeu-se em sua alma. Curvou-se como quem se rende e respirou fundo, como quem entende o que faz. Apanhou em seus braços magros o seu universo em noites de festa, músicas inventadas e sonhos ternos de manhãs de sol, de versos simples e sinceros e caretas nas fotografias e deixou que escorresse sobre esses pequenos retratos a lágrima teimosa. Colocou tudo na mochila e mais. Os sonhos e o brilho dos olhos, os abraços afetuosos e os gestos que de tão cuidadosamente observados, preservaram-se vivos. Recolheu os nomes dos filhos, e os lugares e os prazeres e os deleites e os enfeites e o aconchego do doce lar. Pôs tudo desordenadamente sobre os ombros, que já estavam pesados de chorar. Meia volta e alguns silêncios.
De olhos banhados, olhava para o seu infinito mundo arborizado, respirou o ar puríssimo uma última vez e disse em sua mente um adeus sofrido. E correu na direção contrária, com tudo o que podia. Corria com determinação e força e coragem, mas sentia o bosque atraír-lhe pelas costas, como numa sucção desenfreada. Corria e corria e considerava tudo o que perdia. Tudo o que ganharia. Tudo o que seria. E quanto mais se afligia, mais intensamente corria. E chorava. E corria um pouco mais. Corria entre os galhos secos espalhados no velho chão (mágico). Corria vendo lateralmente o mundo de sonhos correr velozmente, enquanto era deixado para trás. E enquanto tudo isso acontecia, ouvia os sons dos risos, das crianças, dos poemas recitados, das canções da trilha e dos suspiros apaixonados misturarem-se ao barulho de seu choro agoniado.
Chegou, enfim. E respirava, ofegante, ofegante, ofegante. Mais ainda respirava. Tirou a mochila das costas rapidamente, esperando que tudo isso acabasse logo. Mas tinha que acontecer. Cavou a terra furiosamente e encontrou-o lá. Abriu o seu velho baú enquanto espremia o coração num franzir de testa. Jogou mochila e tudo e ficou sem nada. Fechou o velho baú em todos os seus ferrolhos, jogou-o de volta no esconderijo e devolveu a terra ao seu lugar. Com as mãos sujas, enxugou a face. Suspirou. Levantou-se e disse: "Está feito." E virou-se, pôs as mãos nos bolsos e saiu, desejando deixar aquele lugar o mais rápido que pudesse.
Nos bolsos, porém, achou uma sementinha, que há muito tinha guardado lá. Lembrou-se que, por um tempo, nem se lembrava mais. E voltou com ternura vagarosamente. Admirou por um tempo o morrinho de areia, seu velho baú enterrado e a sua mochila, carregada de fragmentos de seu castelinho. Suspirou profundamente. Curvou-se uma última vez e plantou ali a vida de seu pé de laranja lima.
Saiu e seguiu, lenta, alheia e só. Levava a terra na face. A terra levava seus fragmentos. Levava na alma a memória. Deixava na terra uma vida. Levava no peito a saudade. Deixava na terra a história. Levava no peito a coragem. Deixava na terra a fé.
Saiu e seguiu, lenta, alheia e só. Levava a terra na face. A terra levava seus fragmentos. Levava na alma a memória. Deixava na terra uma vida. Levava no peito a saudade. Deixava na terra a história. Levava no peito a coragem. Deixava na terra a fé.
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